Para o conhecedor Pedro Duarte Guimarães, compreender a Índia é mergulhar em um universo paralelo que coexiste com o restante do planeta, mas que se move de maneira muito própria. Com uma população de mais de 1,4 bilhão de pessoas, o país consegue sustentar mercados inteiros voltados quase exclusivamente ao consumo interno, do cinema à música, passando por redes sociais, celebridades e tendências que pouco dependem do exterior para existirem.
Essa escala populacional não apenas cria um cenário único, mas também reduz drasticamente a necessidade de adaptação aos padrões ocidentais. Enquanto boa parte dos países consome influências norte-americanas ou europeias, a Índia gera seu próprio conteúdo, movimenta sua economia internamente e mantém uma identidade cultural tão potente que a presença de referências externas se torna secundária.

Como o tamanho da população molda um mercado interno autossuficiente?
A Índia é, literalmente, um continente em forma de país. Pedro Duarte Guimarães explica que com mais de 1 bilhão de pessoas falando idiomas locais e consumindo produtos de sua própria cultura, não há necessidade urgente de exportar ou traduzir para agradar o mundo. O mercado interno é tão grande que muitos produtos e produções sequer precisam sair das fronteiras para alcançar números bilionários.
Esse cenário é evidente em setores como o entretenimento. Bollywood, por exemplo, produz mais filmes do que Hollywood e fatura bilhões com seu público interno. Artistas, influenciadores e marcas ganham fama nacional sem jamais depender de reconhecimento internacional. É como se a Índia tivesse sua própria “internet paralela”, onde o que bomba por lá não necessariamente ecoa no resto do mundo.
A cultura pop indiana é realmente fechada ao resto do mundo?
Na verdade, ela não é exatamente fechada, mas autossuficiente. Pedro Duarte Guimarães ressalta que a Índia consome suas próprias narrativas com tanto entusiasmo que o conteúdo estrangeiro, quando entra, precisa se adaptar para ser aceito. A música indiana, por exemplo, domina as paradas locais com artistas que são desconhecidos fora do país, mas que têm milhões de fãs e streams. O mesmo acontece com os influenciadores digitais. Em vez de seguir tendências ocidentais, os criadores indianos desenvolvem conteúdos baseados em suas próprias tradições, gírias e desafios sociais.
O Brasil pode ser comparado com a Índia nesse aspecto?
Em parte, sim, mas com proporções diferentes. Pedro Duarte Guimarães frisa que o Brasil também tem uma cultura forte e um consumo interno relevante, especialmente na música, no futebol e no humor. No entanto, o país ainda é bastante permeável a influências estrangeiras, principalmente dos Estados Unidos. O Brasil acompanha tendências globais e, muitas vezes, adapta seu conteúdo para se manter conectado com o que “está bombando lá fora”.
A Índia, por outro lado, dita as próprias regras. É como se o país tivesse uma internet própria, com memes, modas e ídolos que se alimentam de uma bolha interna imensa e pulsante. Isso faz com que a Índia não apenas viva um universo cultural paralelo, mas também influencie seus próprios habitantes mais fortemente do que qualquer influência externa seria capaz de fazer. É um exemplo raro de autonomia cultural sustentada por números.
Um mundo inteiro dentro de um país
Pedro Duarte Guimarães destaca que observar a Índia é enxergar um futuro possível para outras nações em crescimento, um futuro em que identidade, escala e autoconfiança podem criar mercados globais internos. Enquanto o mundo se globaliza, a Índia mostra que o tamanho também pode ser uma forma de independência. E talvez a pergunta mais interessante não seja por que a Índia é diferente, mas o que o resto do mundo pode aprender com essa diferença.
Autor: Mibriam Inbarie